Descoberta foi feita durante pesquisa da ONG SOS Mata Atlântica; águas mais quentes muda PH e reduz oxigênio do rio

SÃO PAULO -- As águas do Rio Tietê, que atravessa praticamente todo o estado de São Paulo, estão mais quentes. Pela primeira vez em 30 anos, pesquisadores identificaram, em vários trechos do rio, temperaturas de 30 graus. À exceção do Nordeste, a temperatura dos rios da Mata Atlântica gira em torno de 18 a 25 graus, mesmo no litoral. Malu Ribeiro, diretora de Políticas Públicas da Fundação SOS Mata Atlântica, afirma que aumento da temperatura da água afeta a vida dentro do rio, muda o PH, reduz o oxigênio e facilita proliferação de algas, segundo a diretora da SOS Mata Atlântica.
Segundo a diretora da SOS Mata Atlântica, a descoberta, feita durante a pesquisa anual de monitoramento da qualidade das águas, pode estar vinculada às mudanças climáticas.
— Nunca tínhamos encontrado temperaturas tão altas como essas. É uma novidade — diz Malu.
Para Malu, o aumento na temperatura das águas vai exigir novas medidas de preservação das matas ciliares, já que elas garantem sombreamento, e novos cuidados para evitar que agrotóxicos sejam carreados para o leito dos rios. Segundo ela, águas mais quentes com defensivos agrícolas podem exigir novos tratamentos nos reservatórios de abastecimento. Em Botucatu, assinala ela, o conselho municipal de meio ambiente elevou para 60 metros a faixa de Mata Ciliar à beira dos ribeirões Lavapés e Tanquinho. É o dobro do que exige o Código Florestal, mas a cidade identificou que os agrotóxicos estavam prejudicando os mananciais.
Os pontos de águas quentes do Rio Tietê são vários. Estão entre os municípios de Itu e Cabreúva, nas cidades de Barra Bonita, Piracicaba, Porto Feliz e Tietê. todas no interior do estado. Em Botucatu, a temperatura do rio chegou a 33 graus. Além do Tietê, rios com menor vazão, como o Piraí, que abastece cidades como Salto e Indaiatuba, também registraram a anomalia na temperatura, o que causou piora na qualidade da água.
Isolamento não melhora qualidade dos rios
Malu explica que a redução da atividade econômica durante a pandemia, que pode ser sentida com a melhoria na qualidade do ar, não surtiu o efeito esperado na melhoria da qualidade das águas.
— De forma geral, a percepção da sociedade de que as condições ambientais melhoraram não se traduziu na qualidade da água, a maioria ficou igual. Não teve reflexo porque os esgotos continuam chegando aos rios, nada mudou. Por outro lado, aumentou a pressão sobre os rios com maior uso de água tratada nas residências e nas áreas urbanas acabamos no zero a zero. Não é porque as pessoas não estão na beira do rio que a sujeira não chega — diz ela.
A especialista alerta ainda para outro efeito desastroso. Segundo ela, o empobrecimento dos brasileiros fez com que muitos perdessem a moradia, aumentando ocupações irregulares em áreas de mananciais, como na região de Itaquaquecetuba e Suzano, na Grande São Paulo, onde a qualidade da água piorou.
— Não houve evolução na coleta e tratamento de esgoto e as metas ficam cada vez mais distantes. A pandemia desviou ainda mais a atenção e as prioridades. E é falsa a expectativa que o cidadão, de forma isolada, ajude a mudar a situação dos rios. Na prática, não saímos do lugar - afirma.
A pesquisa de qualidade de águas dos rios da Mata Atlântica é feita em 130 pontos de monitoramento, distribuídos em 77 trechos de rios e corpos d’água brasileiros, em 64 municípios, nos 17 estados do bioma Mata Atlântica. As coletas foram feitas entre março de 2020 a fevereiro deste ano. Do total, 73% apresentaram qualidade regular, 16,9% ruim e 10% em boa condição. Não foram identificados corpos d’água com qualidade de água ótima ou péssima.
Dos 130 pontos, 95 são fixos e permitem comparar a evolução. Nesta amostra, 10 apresentaram melhoria na qualidade. A grande maioria — 75 - permaneceu estável. De acordo com avaliação da Fundação SOS Mata Atlântica, a melhoria foi decorrente de obras de saneamento básico ou da proximidade com áreas protegidas ou matas nativas, como os rios Pratagy, em Alagoas, Biriricas, no Espírito Santo, o Córrego Bonito, no Mato Grosso do Sul. O Rio Tietê alcançou qualidade boa em Salesópolis, onde fica a nascente, por exemplo.
Fonte: O Globo